Rabeca, um patrimônio cultural em harmonia

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A Rabeca de Bragança. Foto: Mário Costa.

Bragança, município do nordeste paraense, é um verdadeiro caldeirão da cultura popular brasileira. Entre suas expressões musicais mais marcantes, destacam-se o retumbão, a mazurca, as toadas da Marujuda de São Benedito e o xote, um gênero que tem identidade própria na região, tanto que por lá é conhecido como xote bragantino, especialmente pela contribuição de um instrumento singular: a rabeca. Esta espécie de violino mais popular, com sua tonalidade característica e um timbre singular, desempenha um papel fundamental na matriz rítmica e melódica do xote bragantino.

De origem árabe, a presença da rabeca em Bragança remonta à chegada dos portugueses ao território brasileiro. Inicialmente introduzida por imigrantes e viajantes que cruzaram o Brasil, a rabeca rapidamente se assimilou ao folclore local. "A rabeca pra mim sempre foi um instrumento que eu gostei muito. Desde criança eu tinha vontade de tocar, mas naquele tempo as coisas eram difíceis. Então tive a oportunidade de comprar uma e comecei a tocar com 10 anos de idade, sozinho mesmo", conta seu Antônio Vieira, 79 anos, um mestre da rabeca que começou sua jornada musical ainda cedo. Hoje, mestre Antônio continua a tocar e a ensinar, preservando a tradição.

O diferencial do xote tocado em Bragança está ligado ao estilo único com que a rabeca é executada, acompanhada de banjo e zabumba. Comparado a outros estilos de xote do Brasil, o de Bragança é mais vibrante e melódico, impulsionado pelas habilidades dos rabequeiros locais. "Quando comecei a tocar, aquilo parece que foi um dom que Deus me deu. A rabeca tem uma alegria que anima o povo. Quando toco, sinto uma grande alegria por manter essa tradição viva", afirma o mestre, que não apenas toca, mas também já ensinou muitos jovens músicos sobre o valor da tradição.

Mestre Antônio Vieira tem 79 anos e continua a tocar rabeca e a ensinar o instrumento, preservando a tradição. Foto: Mário Costa.

Entre esses jovens, está Gênesis Santos, um rabequeiro de 32 anos, que, além de tocar, é também um dos poucos que ainda mantem a arte de construir o instrumento. " A rabeca que eu construo aqui é toda feita com madeiras locais, como o cedro, o marupá e a maçaranduba, em um processo todo manual, com faquinhas e formões. A gente faz isso, porque a gente quer ver essa cultura da rabeca sendo difundida pelo município e não deixá-la morrer. Quero que saibam que a rabeca é mais do que um instrumento: é um símbolo da nossa identidade", explica Gênesis. Sua paixão pela rabeca é evidente e seu desejo de repassar o conhecimento é um testemunho da vitalidade da cultura local.

Gênesis Santos é um rabequeiro de 32 anos que, além de tocar, é também um dos poucos que ainda mantem a arte de construir o instrumento. Foto: Mário Costa.

A difusão do xote na região bragantina não se limita apenas às rodas de música e dança. O ritmo também é presença obrigatória na Casa de Xote do Arraial do Caeté, tradicional festival junino da região bragantina, realizado este ano, entre os dias 03 e 08 de junho, um espaço cultural que promove apresentações de grupos musicais, oficinas e concursos que valorizam as tradições locais. "Além de celebrar o xote, nossa intenção com esse espaço é também resgatar e valorizar a cultura e a tradição da nossa gente. Temos rabequeiros de várias idades tocando juntos, misturando passado e presente, casais dançando com animação e músicos apresentando o seu talento. É um lugar onde todas as vozes se unem", destaca Vinícius Reis de Oliveira, secretário de Cultura e Desportos de Bragança.

Neste ambiente, a rabeca não é apenas um instrumento; ela se tornou um elo que une gerações e celebra a rica herança cultural de Bragança. O xote, com sua mistura de melodia e ritmo, continuando a ressoar nas esquinas e festas da cidade, garante que a tradição se mantenha viva.

A rabeca, em sua simplicidade e beleza, é muito mais do que um instrumento musical; ela é um símbolo da resistência cultural e da continuidade das tradições em Bragança. O xote, mergulhado na sonoridade da rabeca, marca um importante aspecto da identidade regional. Enquanto mestres e jovens rabequeiros se reúnem para tocar, dançar e ensinar, a cultura do xote em Bragança permanece próspera, assegurando que o legado das gerações passadas continue a circular entre as manifestações culturais da comunidade bragantina.